Duas realidades existem nas bibliotecas públicas do Distrito Federal. De
um lado, investimentos em ambientes digitais modernos e espaços adequados para
leitura e estudo. Do outro, salas apertadas e sem sistema de refrigeração, com
móveis velhos e poucas opções de conforto aos frequentadores. O fechamento da
Biblioteca Demonstrativa do DF, em maio, foi um dos indícios de que muito
precisa ser feito.
O espaço na 506 Sul, por sinal, foi alvo de protesto da comunidade
local. À época, abraço simbólico no prédio e manifestações foram agendados. A
Demonstrativa é de responsabilidade do Ministério da Cultura, e precisou ser
fechada devido a problemas de infraestrutura, ainda não solucionados. Como
opção, muitos migraram o local de estudo para a Biblioteca Pública de Brasília,
na 312/313 Sul, de responsabilidade da Secretaria de Cultura.
A alternativa, no entanto, não tem agradado todos os frequentadores. “A
parte externa é boa, mas achei mal conservada”, diz o estudante Pedro Henrique
Lantine, de 16 anos. Ele admite sentir falta da Biblioteca Demonstrativa, mas
afirma que a varanda do novo local de estudo ao menos é agradável. O rapaz faz
uso do espaço para ter aulas de reforço de matemática com o professor
particular, o aluno da UnB Pedro Melo, de 19 anos.
“Confesso que não conhecia essa biblioteca. Deveria ter mais divulgação
a respeito e poderiam investir em equipamentos para cá”, sugere o instrutor.
Professor e estudante concordaram que as mesas bambas e as cadeiras descascadas
eram a parte negativa do arejado lugar.
De acordo com a Secretaria de Cultura, cerca de 500 mil pessoas
frequentam as bibliotecas públicas do DF por ano e o acervo tem mais de 400 mil
exemplares.
Modernização
Atualmente, quatro bibliotecas do DF passam por modernização, sendo que
outras três tiveram o processo concluído recentemente. Para Wander Filho,
diretor do Sistema de Bibliotecas Públicas, parte do problema reside na gestão
dividida das mesmas. “Temos 11 órgãos e entidades do DF, nove secretarias de
governo mais o arquivo público e as administrações regionais por trás”, diz.
Existem 27 bibliotecas públicas no DF. A maioria delas é de
responsabilidade regional, mas existe falta de conscientização dos gestores
quanto à questão. “Não estamos fazendo diferente do resto do Brasil, mas
geralmente eles não entendem que a leitura é tão importante quanto uma
festa”, acredita Filho.
Programa alia leitura a outras atividades
Segundo Wander Filho, diretor do Sistema de Bibliotecas Públicas, um
projeto de modernização é o Bibliotecas do Cerrado, responsável pela melhoria
das bibliotecas Nacional, do Núcleo Bandeirante e do Cruzeiro. De acordo com
ele, a iniciativa foi inspirada em um modelo colombiano de reorganização e
destinação de espaços com objetivo de integrar mais áreas de interação ao local
onde, antes, havia “apenas” livros.
Wander destaca que “também foi feita uma espécie de política pública. As
bibliotecas foram usadas estrategicamente para fazer ações, como da Secretaria
da Criança, que fez encontros para explicar a alunos da rede pública seus
direitos e deveres”, conta Wander. Ele acredita na possibilidade, também, de
transformação do público mais comum nesses lugares.
“Ao estabelecer o projeto, trouxemos também a terceira idade, a criança
e o adolescente para esses lugares”, comenta. No ano passado, indica o diretor,
o Cerrado aconteceu de agosto a dezembro, com atrações variadas e incentivos
para o uso do espaço bibliotecário para atividades diversificadas. O resultado
foi presença de quase 60 mil pessoas nas três bibliotecas contempladas
(Nacional, Núcleo Bandeirante e Cruzeiro).
Mudança agrada frequentadores
A Biblioteca
Vó Philomena, no Núcleo Bandeirante, foi uma das mais beneficiadas pelo
projeto de modernização Bibliotecas do Cerrado. Lá, há um telecentro, com 12
computadores à disposição, e um acervo específico, turbinado por contribuições
do Arquivo Público do DF, sobre a história da cidade.
A eletrotécnica Lilian de Almeida, de 35 anos, aprovou as mudanças em
relação ao que presenciou antes de agosto de 2013. “O laboratório de
informática ajuda muito e ultimamente tenho vindo muito para cá para estudar”,
conta. “Antigamente nem ar-condicionado tinha, então quando ficava quente era
difícil fazer qualquer coisa, quem dirá ler”, recorda-se.
Ela defende ser fundamental haver espaço de qualidade, pois, além da
possibilidade de estudo, é um importante local de conservação da memória
escrita e literária regional e nacional.
“Mesmo com a internet, nada substitui um livro”, disse. Sua única
crítica é referente a minúcias. “Só acho que deveria haver mais cadeiras, pois
há sempre muita gente querendo sentar”, opina.
Ao ar livre
Fora do espaço das bibliotecas, existem iniciativas que permitem acesso
à literatura ao ar livre, em ações curiosas. Na Asa Norte, incentivadas pelo
açougue cultural T-Bone, as paradas de ônibus ganharam estandes com livros,
liberados ao público em geral para pegar à vontade, contando com o bom
senso para a devolução.
Criatividade como estímulo
Na QE 32 do Guará II, uma ideia criativa para incentivar o hábito da leitura
entre os moradores chamou a atenção. Uma geladeira inutilizada foi pintada e
caracterizada para conter livros. É uma opção para os cidadãos não precisarem
ir até a Biblioteca do Guará, ao lado do Cave, e ainda deixa a pracinha mais
agradável. A estudante Darciane Diogo Gonçalves, 17 anos, aprovou.
“Abri de curiosidade uma vez. Primeiro achei estranho, porque é uma
geladeira, mas depois pensei ser uma forma criativa de transmitir educação”,
diz a moça, que mora na QE 40, mas frequenta a 32 semanalmente.
Alto investimento
O investimento para transformar o Núcleo Bandeirante e Cruzeiro, além da
Biblioteca Nacional, em referências não foi pequeno. Cerca de R$ 500 mil foram
investidos somente nas três. Com a expectativa de ampliar o Cerrado para todos
os espaços públicos do DF, mais dinheiro ainda deve ser demandado. Assim, é
fundamental que não seja repetido o descaso, como visto na Demonstrativa.
Na era da digitalização das informações e da agilidade dos dados, talvez
os livros pareçam obsoletos. Daí a necessidade de transformar os espaços em
zonas multiculturais, capazes de agregar a comunidade e promover atividades
produtivas.
“As bibliotecas deveriam servir para procurar emprego, entrar em contato
com seu deputado ou ler um livro. Uma biblioteca pode fazer diferença no
desenvolvimento da comunidade”, diz o diretor do Sistema de Bibliotecas
Públicas, Wander Filho.
Fonte: Jornal de Brasília.
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