Recentemente, o TJ/SP já havia decidido, por v.u., que a ABNT não podia
cobrar direitos autorais da TARGET Engenharia e Consultoria Ltda., pelo uso que
esta faz das normas técnicas da ABNT para prestar consultoria a seus clientes.
Menos de 1 mês após a decisão da Justiça Estadual, a mesma matéria foi
objeto do acórdão da 5ª turma do TRF da 3ª região, relator Des. Antônio
Cedenho, nos termos da ementa a seguir:
“PROCESSUAL CIVIL. PROPRIEDADE INTELECTUAL. NORMAS
TÉCNICAS DA ABNT. APLICAÇÃO DO REGIME DE DIREITOS AUTORAIS. IMPOSSIBILIDADE.
NORMALIZAÇÃO VOLUNTÁRIA. SIMPLES COLABORAÇÃO DE ASSOCIAÇÃO CIVIL. INCORPORAÇÃO
POR REGULAMENTO TÉCNICO. GANHO DE JURIDICIDADE. CONHECIMENTO TECNOLÓGICO.
INAPLICABILIDADE DA LEI N° 9.610/1998. ISENÇÃO DE CUSTAS. NECESSIDADE DE
REEMBOLSO DE DESPESAS DO VENCEDOR. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. MANUTENÇÃO. REMESSA
OFICIAL E APELAÇÕES DESPROVIDAS.
I. A ABNT exige direitos autorais no contexto de serviço público federal,
especificamente a metrologia, a normalização e a qualidade industrial. A
tolerância dos órgãos e entidades do SINMETRO indica que a cobrança é admitida
normativa e administrativamente, tanto que o artigo 5° da Lei n° 4.150/1962
qualifica a associação como órgão de utilidade pública. A União possui, assim,
legitimidade.
II. A incompatibilidade das normas técnicas com os direitos autorais não é
definida pela natureza da atividade da ABNT, que simplesmente recebeu uma
qualificação especial da lei, sem que isso lhe traga um espaço na estrutura
político-administrativa do Estado ou confira às determinações fixadas a posição
de regras jurídicas, atos oficiais.
III. O direito de Target Engenharia e Consultoria Ltda. provém das próprias
restrições previstas pela Lei n° 9.610/1998 à propriedade intelectual.
IV. O procedimento de elaboração das normas técnicas no âmbito da ABNT é
marcado pela participação de especialistas da área abrangida, que utilizarão os
conhecimentos técnicos disponíveis no mercado para responder à demanda de
normalização voluntária.
V. Rigorosamente não existe criação do espírito, manifestação da
individualidade intelectual; os participantes se restringem a captar
informações técnicas já propagadas, com estabilidade suficiente para
consubstanciar um guia de adequação de insumos, produtos ou serviços.
VI. A Lei n° 9.610/1998, no domínio das ciências, preserva como direito autoral
apenas a forma literária ou artística. O conhecimento tecnológico é
explicitamente excluído, sem prejuízo da aplicação do regime industrial de
tutela (artigo 7°, §3°).
VII. A ABNT poderia no máximo requerer a proteção do trabalho de compilação
(artigo 7°, XIII). O conteúdo científico, as normas técnicas são invulneráveis.
VIII. Ainda que se cogitasse de propriedade intelectual, a associação não
poderia se apropriar dos direitos correspondentes.
IX. Além da inexistência de contrato que a credenciasse como organizadora,
muitos dos participantes do procedimento não são associados; pertencem a
segmentos diversos da sociedade civil e não consentiram em que os respectivos
interesses fossem representados por uma organização coletiva (artigo 17 da Lei
n° 9.610/1998).
X. A isenção de custas judiciárias não é tão radical a ponto de exonerar a
Fazenda Pública do dever de reembolso. O vencedor da demanda tem o direito de
repetir os valores gastos com a ativação do poder jurisdicional.
XI. A condenação da União ao pagamento de verba honorária de 5% do valor da
causa - R$ 20.000,00 - não contradiz os critérios do artigo 20, §3° e §4°, do
CPC, especialmente o fundamento da equidade.
XII. Para um processo iniciado em 2006, de alta complexidade, que demandou
intervenções constantes dos advogados, a quantia de R$ 1.000,00 se revela até
insuficiente.
XIII. Remessa oficial e apelações a que se nega provimento.” (Apelação
Cível nº 0010071-65.2006.4.03.6100. D.J.E. de 02/04/2014)
Se a decisão do TJSP poderia eventualmente ser considerada de alcance
restrito às partes em litígio, esta, da Justiça Federal, considera as normas
técnicas da ABNT em sua generalidade, de forma que empresas de consultoria na
área industrial e de meio ambiente podem livremente copiar tais normas técnicas
e fornecer essas cópias a seus clientes em forma física ou digital, tendo em
vista o relevante interesse público envolvido na divulgação das normas
técnicas.
Fonte: Migalhas.
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